Sete meses após deslizamento de pilha de rejeito, retorno de famílias ainda é incerto em MG
09/07/2025
(Foto: Reprodução) Montanha de rejeitos desmoronou em Conceição do Pará (MG) e tirou mais de 250 pessoas de casa. Sem a conclusão de estudos que afastem risco de novos deslizamentos, famílias estão inseguras. "Não quero morar no meio do perigo”, disse uma moradora. Sem regras de fiscalização, pilhas de rejeito substituem as barragens na mineração
No dia 7 de dezembro de 2024, uma pilha de rejeitos da mineradora Jaguar Mining desabava no povoado de Casquilho de Cima, em Conceição do Pará (MG), e deixava cerca de 250 pessoas desalojadas. Sete meses depois, o retorno de algumas delas para suas casas ainda é incerto.
Segundo a moradora Lexandra Machado, muitas famílias têm medo de voltar, porque não foi apresentado estudo ou laudo técnico que ateste a segurança da região e afaste o risco de novos deslizamentos.
Reportagem do g1 mostrou que as pilhas de rejeito têm sido utilizadas pelas mineradoras como uma alternativa mais segura às barragens a montante, que foram proibidas no Brasil após a morte de quase 300 pessoas nas cidades de Brumadinho e Mariana, em 2015 e 2019.
Embora tenham menor potencial de dano, ainda não há regulamentação federal e protocolo de fiscalização, o que também torna as pilhas de rejeito um risco, segundo especialistas. O governo federal prevê definir regras até 2026.
Análise de segurança não foi concluída
O g1 procurou a mineradora Jaguar Mining e os órgãos públicos envolvidos para obter informações sobre o andamento dos estudos que garantam o retorno das famílias desalojadas com segurança.
Até agora, 11 famílias fecharam acordo com Jaguar Mining, segundo dados da Defensoria Pública. Dessas, sete não poderão voltar para casa. Outras quatro poderão voltar, mas só depois que o acesso ao local for liberado. E elas não sabem quando isso vai acontecer.
Ao todo, os pactos já celebrados somam R$ 6,2 milhões de indenizações. Outras 29 famílias estão em fase final de negociação.
Pilha de rejeito desmoronou em Minas Gerais e deixou sete casas soterradas
Arte g1
De acordo com a defensoria, que assinou um Termo de Compromisso com a mineradora para indenização das famílias, o retorno e a garantia de segurança para elas dependem da Defesa Civil e da Agência Nacional de Mineração (ANM).
A Defesa Civil de Minas Gerais não respondeu até a publicação da reportagem.
Já a ANM informou que essas questões extrapolam a sua esfera de atuação técnica, mas disse que “tem ciência de que a empresa estaria elaborando um estudo de ruptura hipotética para a pilha, a ser apresentado após a conclusão das obras de readequação da estrutura”.
Segundo o órgão, “esse tipo de estudo é fundamental para aprimorar a análise de estabilidade da pilha e subsidiar eventuais medidas de segurança”.
Procurada, a mineradora disse que as medidas de segurança necessárias para garantir o retorno dos moradores às suas casas estão sendo tratadas com os órgãos responsáveis e que foi contratada uma auditoria técnica independente que validará os estudos.
Questionada sobre que estudos são esses, se eles já foram finalizados e quais as conclusões, a empresa afirmou que são “estudos de retorno quanto à situação das estruturas e às obras”.
Acordos com 11 famílias
Os acordos fechados entre a mineradora e 11 famílias afetadas pelo deslizamento prevê que quem foi removido definitivamente poderá receber indenização de R$ 100 mil por dano moral, além dos valores a serem calculados pelo terreno, pelo imóvel e por outros bens perdidos.
Já as famílias que poderão retornar, se fizerem o acordo com a empresa, podem receber indenização por dano moral de R$ 20 mil, uma verba de R$ 97 mil para eventuais reformas e aquisição de mobília e outros bens, além de uma verba de restrição temporária da moradia no valor de R$ 18 mil.
Anomalia é constatada em pilha de rejeitos em Conceição do Pará
Corpo de Bombeiros/Divulgação
Para quem desenvolvia atividade geradora de renda no imóvel, o Termo de Compromisso estabelece a compensação por perdas financeiras, lucros cessantes e outros prejuízos sofridos.
‘Morar no meio do perigo’
Segundo Lexandra, a mineradora ainda não a procurou para fazer o acordo. Ela está entre os moradores cujas casas eram mais distantes da pilha e, por isso, a indenização não seria suficiente para comprar outro imóvel, porque elas poderiam voltar para a antiga casa.
As incertezas com relação ao risco de novos desabamentos, contudo, estão angustiando a moradora.
“Eu vou ser obrigada a voltar pra lá e viver esse terror de novo? Não tem perspectiva nenhuma de que ali é seguro. Não quero morar no meio do perigo”, disse Lexandra.
A adesão ao acordo é facultativa e não impede que a pessoa afetada recorra à justiça para buscar outros direitos. É o que Lexandra pretende fazer. “Para eles, foi um escorregamento. Para nós, é uma tragédia”, disse a moradora.