Mudança da capital, ditadura e fé: os episódios pouco contados do Território Federal do Amapá
13/09/2025
(Foto: Reprodução) Exposição apresenta matérias da exploração mineral no Território Federal do Amapá
O Amapá foi Território Federal entre 13 de setembro de 1943 e 5 de outubro de 1988 e celebra 82 anos de criação neste sábado (13). O g1, em comemoração, separou fatos históricos, imagens e curiosidades pouco conhecidas do período.
Durante os 45 anos, o ex-Território passou por transformações políticas e sociais marcantes, como a criação estratégica durante a 2ª guerra e a exploração mineral do manganês.
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Mercado foi inaugurado por Janary Nunes, nos 10 anos do Território Federal do Amapá
Arquivo/Edgar Rodrigues
Apesar dos fatos conhecidos, a história conta com curiosidades pouco comentadas, que vão desde a mudança da capital até o momento em que o regime militar passou a reprimir lideranças religiosas.
Em alusão à data, neste sábado (13), escolas e servidores do Amapá participam do tradicional desfile cívico. A apresentação será no Sambódromo, localizado na Zona Sul de Macapá, a partir das 16h.
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Criação do ex-Território
Museu Histórico do Amapá Joaquim Caetano da Silva é reaberto em Macapá - pedra de manganês extraída no Amapá; ao fundo, Janary Nunes, primeiro governador do Território Federal do Amapá
Rafael Aleixo/g1
Instituído em 1943, durante a 2ª Guerra Mundial, o território foi concebido por decreto de Getúlio Vargas como parte de uma política geopolítica para proteger a Amazônia e as riquezas minerais. O capitão Janary Gentil Nunes foi nomeado o primeiro governador.
O Amapá passou por transformações desde a descoberta de jazidas de manganês em Serra do Navio, em 1945, atraiu investimentos estrangeiros e consolidou a presença da empresa americana Icomi, que influenciou o estilo de vida local com infraestrutura urbana planejada e traços culturais importados.
Paralelamente, o território enfrentou disputas diplomáticas e desafios sociais, como a falta de autonomia legislativa e a nomeação de governadores pela presidência da República.
A transformação em estado, com a promulgação da Constituição de 1988, encerrou o ciclo territorial e inaugurou uma nova era de protagonismo político e desenvolvimento social para o Amapá.
🏙 Mudança da capital
Fortaleza de São José de Macapá, durante o Território Federal do Amapá
IBGE/Cidades
Inicialmente, o município de Amapá foi escolhido como capital do território, conforme o decreto-lei nº 5.839, de 21 de setembro de 1943 , apenas oito dias após a criação oficial. Na época, o ex-Território Federal do Amapá foi formado por três municípios: Macapá, Mazagão e Amapá.
Apesar da escolha oficial, a capital nunca chegou a funcionar na cidade de Amapá. Quando Janary Nunes assumiu o governo do território, em 25 de janeiro de 1944, solicitou ao governo federal a mudança para Macapá.
O historiador amapaense Bruno Machado, explicou sobre os episódios pouco conhecidos da história local. Segundo Bruno, a troca foi motivada por questões logísticas e estratégicas. A mudança foi oficializada pelo decreto-lei nº 6.550, de 31 de maio de 1944.
“Macapá tinha melhor acesso fluvial, porto mais estruturado, proximidade com Belém e terra firme para urbanização. Além disso, a Fortaleza de São José poderia ser aproveitada como ponto turístico”, explica.
Bruno também destaca que Macapá era, historicamente, mais relevante e tinha maior potencial de desenvolvimento econômico.
Fortaleza de São José de Macapá no início da criação do estado do Amapá
Reprodução/Internet
⛪A igreja católica
Líderes religiosos sofriam repressão militar na época do ex-território
Reprodução/Internet
Outro ponto pouco abordado na história do território é a atuação da Igreja Católica durante os anos da ditadura militar. Bruno Machado lembra que, enquanto o Brasil vivia o regime autoritário, o Amapá ainda era território federal.
“O imaginário coletivo associa o território apenas à sua criação e ao governo de Janary, mas ele existiu durante toda a ditadura, de 1964 a 1985”, disse.
Durante esse período, padres católicos - especialmente os italianos - foram vigiados pelos órgãos de repressão. Eles foram acusados pelo Serviço Nacional de Informações (SNI) de promover reuniões com estudantes e de ter tendências progressistas.
“Alguns padres foram considerados pela ditadura, aqui no Amapá, como subversivos, como progressistas. [...] Porque eles mobilizavam, faziam reunião com os estudantes, com professores, davam aquela formação a partir da fé, que envolvia também análise de conjuntura política, social, econômica”, complementou.
Entre os religiosos monitorados estavam o padre Jorge Basile e o padre Gaetano (ou Caetano) Maiello. Ambos italianos e atuantes na Prelazia de Macapá, pois em 1971 ainda não era Diocese.
“Não é que eles eram contrários ou a favor que a ditadura caísse, mas algumas ações, alguns discursos deles, ainda que de forma sutil, não eram vistos de forma positiva. Porque uma ditadura, e aqui no território federal do Amapá não foi diferente, tinha medo de qualquer associação civil”, completou.
Padres Jorge Basile e o padre Gaetano (ou Caetano) Maiello
Reprodução/Porta-retrato
A repressão também atingiu instituições ligadas à Igreja, como a Rádio Educadora São José e o jornal Voz Católica.
“Um ou outro ali fazia alguma crítica às questões da sociedade, à vida aqui no território federal do Amapá, sobretudo de Macapá, e que era vigiado pelos militares e não era bem visto.”
Bruno cita um documento confidencial de 1971 que mostra como os padres eram espionados. Para Bruno, essas ações mostram que havia uma resistência possível, mesmo em tempos de repressão.
“O padre Jorge Basile foi acusado pelo SNI de ser agitador estudantil [...] Eles faziam toda uma investigação sobre determinadas pessoas [...] Simplesmente reunir pessoas e ali fazer uma espécie de associação da fé à conscientização dos seus direitos. Então esses padres foram duramente vigiados, espionados pela ditadura”, finalizou.
Documento mostra documento confidencial
Divulgação/Bruno Machado
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